segunda-feira, 12 de julho de 2010

Com faculdade, é melhor negociar

Com faculdade, é melhor negociar

Instituições podem recusar a renovação de matrícula dos alunos inadimplentes, mas são obrigadas a fornecer histórico escolar e documentos para transferência. Acordo é boa saída para resolver pendências.

Gazeta do Povo, em 12/07/2010

O fim do primeiro semestre letivo abre a temporada de negociações para os alunos que não conseguiram manter em dia as mensalidades da faculdade particular e precisam fazer a rematrícula. A lei permite a exclusão do estudante devedor no fim do período letivo, mas a instituição não pode reter documentos – como o histórico escolar – do aluno inadimplente, caso ele queira se transferir para outro local de ensino. A negociação também é o melhor caminho para que o formando com débito pendente garanta o recebimento do diploma.

De janeiro a junho deste ano, a Coordenadoria Estadual de Proteção e Defesa ao Consumidor (Procon-PR) registrou 229 atendimentos referentes à retenção de documentos de instituições de ensino. Em todo o ano de 2009, foram 511 reclamações no órgão.

A bióloga Silvana Clarise da Silva concluiu o curso em 2008 pelo Centro Universitário Campos de Andrade – Uniandrade, de Curitiba, mas ficou devendo um ano inteiro de mensalidades à instituição. Com isso, ela não conseguiu a liberação do diploma, apesar de ter tentado acordo para quitar as dívidas acumuladas em R$ 10 mil. “Tentei negociar, mas eles exigem 50% do valor à vista e o restante em duas vezes”, alega.

Silvana relata que, sem o documento, já perdeu algumas oportunidades de emprego, por não conseguir o efetuar o registro profissional no órgão de classe. “Sem o diploma não consigo emprego e, sem emprego, não tenho condições de pagar o que devo. Eles deveriam ser mais flexíveis”, diz. A bióloga tenta agora um acordo através do Procon para renegociar a dívida e conseguir a liberação do diploma. Procurados pela reportagem, nenhum representante da instituição quis comentar o assunto.

De acordo com a advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Mariana Ferreira Alves, o contrato de renegociação não pode trazer disposições menos favoráveis ao aluno do que o contrato original. “Porém vale lembrar que sobre o valor devido pode incidir correção monetária e juros moratórios”.

Franciele Paola Tatarin, estudante de Administração de Empre­sas da UniBrasil – Faculdades Integradas do Brasil, também de Curitiba, conta que começou a enfrentar dificuldades para pagar a mensalidade em função de uma doença grave da mãe. Para não abandonar os estudos, a aluna requereu uma bolsa que, segundo ela, foi aprovada pelo departamento jurídico da instituição, mas, em seguida, vetada pelo setor financeiro. “A solução foi pedir o trancamento do curso e tentar me transferir para outra faculdade mais barata. Mas, quando solicitei [a transferência], a instituição alegou que eu deveria pagar a rematrícula de R$ 694 para o segundo semestre, para, só então, liberarem meus documentos”, diz. Com base no Código de Defesa do Consumidor, os especialistas afirmam que, mesmo em casos de inadimplência, a instituição não pode se negar a fornecer histórico escolar ou documento de transferência aos alunos. Caso isso ocorra, o Idec orienta denunciar a prática ao Procon ou à Justiça, não sem antes tentar uma conciliação amigável com o estabelecimento de ensino.

Sem pedido

Por meio de nota, a UniBrasil informa que a aluna não havia formulado, perante a instituição, um pedido oficial de trancamento ou transferência de matrícula. “A referida aluna não fez ainda qualquer pedido de fornecimento de documentos acadêmicos para fins de transferência. Os alunos da instituição podem fazer pedidos de documentos acadêmicos, de trancamento de matrícula ou de transferência por meio do protocolo da instituição”, explica a UniBrasil.
De acordo com Franciele, o pedido de trancamento não foi formulado porque ela deveria pagar a rematrícula para dar andamento ao processo de transferência.

Fique atento

Conheça os direitos e as regras que regem a relação do estudantes com as instituições de ensino:

Reajustes

A instituição de ensino deve divulgar 45 dias antes do término do período de matrícula, de acordo com seu calendário e cronograma, o texto da proposta do contrato, o valor total ou semestral e o número de alunos por sala/classe.

Mensalidades

Depois de calcular o reajuste, o valor integral é dividido em 6 ou 12 vezes, conforme o regime de avaliação semestral ou anual. A matrícula deve fazer parte do valor integral da anuidade e não pode constituir uma parcela a mais.

Desistência

Em caso de desistência antes do inicio do ano letivo, a escola deve devolver ao consumidor o valor pago pela matrícula, devidamente atualizado. É abusiva a cláusula contratual que estabeleça a não devolução do valor pago. A instituição pode cobrar multa pela desistência, desde que ela não ultrapasse 10% do valor integral da anuidade.

Cobranças extras

Além da mensalidade, algumas faculdades arrecadam taxas e contribuições extras. A medida é válida para cobrir gastos extraordinários, mas há serviços diretamente ligados à educação que não podem ser cobrados separadamente, como a utilização de bibliotecas, material de ensino para uso coletivo, material destinado a provas e exames, certificados de conclusão de curso, boletins de notas, cronogramas e programas.

Inadimplência

Os estabelecimentos e ensino não podem aplicar qualquer espécie de penalidade pedagógica ao aluno em débito. Também são proibidos de reter documentos necessários à transferência para outra instituição ou suspender o aluno de provas escolares.

Período letivo

A escola não pode cancelar a matrícula do aluno antes do término do curso. No entanto, a lei autoriza que as instituições recusem a renovação da matrícula de alunos em débito.
Fonte: Idec

Legislação

Sanção pedagógica é proibida

As instituições de ensino podem usar todos os meios legais para cobrar os inadimplentes, mas são impedidas de impor sanções pedagógicas, como, por exemplo, impedir a realização de provas ou proibir o aluno de frequentar as aulas para o período para o qual está regularmente matriculado.

“A dívida não pode ser cobrada de forma que exponha o aluno ao ridículo ou, ainda, a constrangimento ou ameaça, pois essas práticas caracterizam crime contra as relações de consumo”, afirma a advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Mariana Fereira Alves.

Com as recentes mudanças na Lei de Execução de Título Extrajudicial, que se aplica aos casos de alunos inadimplentes, o estabelecimento de ensino pode obter uma certidão para bloquear ou penhorar bem imóvel do devedor junto ao cartório. De qualquer modo, o devedor terá possibilidade de defesa após o depósito da quantia devida em juízo ou a indicação de bens que possam ser penhorados para garantir o pagamento da dívida, assim como já acontecia antes das alterações na legislação.

De acordo com o Código Civil, o prazo para a instituição de ensino ajuizar ação de cobrança contra o aluno inadimplente é de no máximo cinco anos.

Diploma grátis

No entendimento do Idec, a cobrança pela confecção ou emissão do diploma de conclusão de curso é proibida. Para isso cita o Código de Defesa do Consumidor (CDC), que confere proteção contra cláusulas abusivas. O artigo 51 determina a nulidade de cláusulas contratuais que estabeleçam “obrigações iníquas” ou coloquem o consumidor “em desvantagem exagerada”. Em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF) em 2007, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, considera inconstitucional a cobrança pelo documento. O principal argumento está na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que não prevê que as universidades estipulem taxas para conceder diplomas e certificados. Segundo o procurador, a emissão do diploma é decorrência natural do término do curso, e, portanto, está integrada aos valores cobrados pela prestação do serviço de ensino, custeadas pelas mensalidades.

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